Ainda somos família
A separação parte-nos ao meio.
Não é só o fim de um relacionamento.
É o fim de uma estrutura, de uma vida pensada a dois.
É um vazio novo, frio, que não se preenche com amigos, com rotinas, nem com frases feitas.
É encarar o espelho e não saber bem quem somos agora.
Porque já não somos “nós”.
Agora sou só eu.
E, quando há filhos, esse vazio transforma-se em peso. Um peso que se carrega todos os dias, mesmo com um sorriso na cara.
Não é apenas a ausência do outro.
É a ausência do que éramos juntos:
Uma casa cheia, uma rotina que nos dava norte,
Um revezar de tarefas, uma partilha silenciosa,
Um “vai tu, que eu fico”, um “descansa, eu dou-lhe banho”.
Agora é tudo a dobrar.
Porque ser mãe numa casa onde somos só nós,
É amar por dois, decidir por dois, ser forte por três.
Mesmo quando não se tem força nenhuma.
E mesmo com um Super Pai, há sempre algo que fica por preencher.
Há uma presença que falta nos dias e nas noites, principalmente.
Nas birras, nos banhos, nas conquistas, nas febres, nas dúvidas,
Nas férias, nos aniversários, no sofá, no carro, na vida.
A ausência pesa mais nos momentos pequenos.
Quando há uma vitória e só temos os nossos próprios braços para celebrar.
Quando o cansaço nos encosta à parede e não há revezos, nem turnos, nem escape.
Quando o choro dele se mistura com o nosso e não há ninguém para segurar um enquanto se acalma o outro.
Quando a gargalhada ecoa e falta uma terceira voz para o som ser completo.
Quando se adormece na cama e se deseja só mais um “boa noite” dito em dupla.
E ainda assim, no meio da exaustão, da solidão, da dúvida que corrói, há um ponto de luz.
Há algo que nos sustém, que nos ancora.
A certeza de que a nossa coisa mais bonita é ele.
E por mais que tudo esteja em constante transformação —
por mais que já não haja “nós” no sentido antigo,
há um “nós” que ninguém nos tira.
Somos três.
Mesmo quando só há dois na fotografia.
Somos sustentados por dois pilares sólidos:
O nosso filho.
E o amor que já sentimos e que, de alguma forma, continuamos a sentir.
Porque o amor muda, sim.
Mas não desaparece quando há um filho no meio.
Só se transforma noutra coisa.
Mais madura. Mais serena.
Mais real.
C.P.